Idéias para ajudar escritores aspirantes, de Roald Dahl

Texto de Roald Dahl, autor de “James e o pêssego gigante” e “A fantástica fábrica de chocolate”:

Reunindo idéias

Quando acordo de manhã, depois de um sonho, fico deitado pensando nele. Cada estranho detalhe está vívido em minha memória. Mas, cinco minutos depois, quando já saí da cama e escovei os dentes, tudo desapareceu. É impossível lembrar sobre o que foi o sonho. Isso acontece a todo mundo. Então o único modo de lembrar os sonhos é manter lápis e papel ao lado da cama, e escrevê-los no momento em que você acordar.

Me acontece exatamente o mesmo com idéias para histórias. Uma idéia pode aparecer de repente a qualquer momento do dia, e se eu não anotar na hora, naquele exato momento, ela irá embora para sempre. Por isso preciso achar um lápis, caneta, giz, batom, qualquer coisa que escreva, e rabiscar algumas palavras que depois me lembrem da idéia. E assim que tiver uma chance, vou direto pra casa e escrevo a idéia num velho caderno escolar vermelho. Às vezes escrevo uma linha; às vezes escrevo uma conversa entre duas pessoas; às vezes escrevo uma pergunta.

Notas e recortes

Eu coleciono fotos de pessoas porque acho que são úteis quando tento descrever personagens nos meus livros. Quando você cria personagens, tem de enxergar os olhos, o nariz, os dentes e a expressão completa da face. Cada detalhe é importante.

Também acho útil anotar fatos interessantes que encontro e que podem ajudar em meus futuros trabalhos. Na capa de trás do meu caderno há uma tabela com o número de respirações e pulsações por minuto de vários animais.

Comece a colecionar fotos e fatos que você considere úteis para seus textos futuros.

Cativar seu leitor

Eu coleciono boas idéias porque os enredos aparecem muito dificilmente. Cada mês ficam mais raros. Toda boa história deve começar com um enredo forte que acumula interesse por todo o tempo até o final. Minha maior preocupação quando escrevo uma história é um terror horrível e constante de cansar o leitor. Consequentemente, enquanto escrevo, sempre tento criar situações que levem meu leitor a

1) rir (altas e sinceras gargalhadas)

2) contorcer-se

3) ficar fascinado

4) ficar TENSO e EXALTADO e dizer “Continue! Por favor continue! Não pare!”

Deve haver um elemento de farsa. Quanto mais selvagem melhor. Você deve sempre ir um pouco mais fundo do que pretendia inicialmente. Quando pensei pela primeira vez em escrever o livro A fantástica fábrica de chocolate, eu nem pensei que haveria crianças nela!

Todos os bons livros devem ter uma mistura de pessoas extremamente desagradáveis – que sempre são divertidas – e algumas pessoas decentes. Vocês imaginam como seria “BGA- O Bom Gigante Amigo” se houvesse apenas um gigante na Gigantelândia? Logo no começo da história, percebi que, se ele era um Bom Gigante Amigo, em algum lugar deveria haver um antagonista ou uma ameaça. Então gradualmente inventei os outros gigantes. “Quantos desses monstros vou fazer?”, pensei. “Quatro? Cinco? Seis?”. Finalmente decidi por oito porque foi muito divertido inventar os nomes.

Em todo livro ou história deve haver alguém pra você odiar. Em James e o pêssego gigante são as tias. Em Danny é o Sr. Hazel. Em Fábrica de Chocolate são as crianças mimadas e sórdidas. Em Os Twits são o Sr. e a Sra. Twit. Quanto mais imunda e pérfida é a pessoa, mais divertido é assistir ela sendo esmigalhada.

Tendo um conjunto de personagens ou uma idéia para o enredo, comece a escrever. Tudo se desenvolve sob o lápis conforme você escreve. Isso realmente acontece. Uma vez perguntaram a Stravinsky, o grande compositor, “Maestro, onde você encontra suas idéias? Durante o banho? Fazendo a barba? Ou explorando os bosques à luz do luar?”. Ele respondeu: “No piano.”

A história da Fábrica de Chocolates

Um dos livros mais difíceis de escrever foi A fantástica fábrica de chocolate. No começo me entusiasmei descrevendo criancinhas horrorosas, o que sempre é divertido. Eu tinha 15 crianças na primeira versão. Dei o manuscrito para meu sobrinho mais novo e disse “O que você acha?”. Ele leu, e depois me respondeu: “Tio Roald, está uma droga. Não gostei nem um pouco.”

Então reescrevi tudo de novo. Você vai ver: quando reescreve, você seleciona a melhor parte do que tinha escrito.



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